Notícias de Angola – Falta audácia para a dinamização da economia nacional
Seis anos depois, continua a falta de audácia em relação ao que realmente importa para a dinamização da economia nacional. Embora saibamos que neste País nunca faltaram boas ideias e boas intenções.
O mais novo Ministro de Estado e da Coordenação Económica (MECE), José de Lima Massano, apresentou, no último dia 14 de Julho, as Medidas de Estímulo à Economia e de Dinamização do seu Potencial, mais uma lista de ideias e boas intenções. Por esclarecer: não se sabe se são mesmo de curto prazo ou para aqui ficarem. Aguardaremos pelo respectivo detalhe. Com honestidade, estávamos à espera que o novo Chefe da Equipa Económica dissesse que promoveria a revisão do OGE 2023, porque está claro para todos que não é real nem está a ser cumprido.
Seja como for, a primeira nota que gostaríamos de realçar, antes de analisarmos em concreto as várias medidas, é que efectivamente faltou audácia do Executivo, na voz de Massano. Francamente, é mais do mesmo e não acreditamos que as medidas ora apresentadas consigam estimular a economia e dinamizar o seu verdadeiro potencial. Falta de audácia, desde logo porque se sabe que grande parte do empresariado ficou de fora do mercado com a depreciação brusca e acelerada do Kwanza e não vimos qualquer medida para mitigar tais efeitos. Falta de audácia, porque não existe uma única medida concreta de apoio ao empresariado.
A segunda nota e primeira crítica que se pode fazer à apresentação das medidas é que ela vem desprovida de quaisquer elementos estatísticos, como se estivéssemos a navegar à vista, sem terra no horizonte, uma prática reiterada do Executivo, denotando falta de sustentabilidade estatística e de estudos. Apresenta-se um conjunto de medidas e os economistas todos aplaudem, tal qual diáconos no culto de domingo. Não se conhecem os impactos na receita fiscal, no crescimento económico, na empregabilidade, no endividamento, na actividade dos empresários após o Junho de 2023, etc. etc…
De resto, entendemos que não se tratam de medidas complementares, porque são, na verdade, as mesmas apresentadas pelo anterior MECE, pelo que o focus e ênfase não deveriam estar em lançar mais medidas, mas, sim, assegurar que as que já foram aprovadas (com muita inteligência, diga-se de passagem), sejam efectivamente implementadas. Isso é um verdadeiro dèjá vu. O novo Boss da Equipa Económica desconsidera absolutamente tudo do antigo, e a plateia, por conseguinte, aplaude. Não pode ser assim. Precisamos dizer que muitas das medidas do anterior Ministro de Estado para Coordenação Económica devem, sim, ser aproveitadas!
Quanto à terceira crítica, a nós parece que o País só tem empresários do ramo agro- industrial. Não foi dita uma única palavra em relação aos demais sectores da Economia, que, de igual modo, andam moribundas. Logo, a ênfase dada às medidas está, em nossa opinião, errada, porque coloca de fora importantes segmentos da nossa economia e que geram muitos empregos, deixando-as mesmo em situação de orfandade.
Para não nos alongarmos, analisaremos então o quadro geral das medidas apresentadas e aprovadas:
Aumento da produção nacional
Foram apresentadas 4 (quatro) medidas, e nenhuma delas representa uma novidade, com uma ligeira diferença. Em alguns casos, o Executivo tem sabido aplicar e noutros, parece-nos que faltou vontade política.
Em relação à Reserva Estratégica Alimentar do Estado (REA), embora sem o detalhe das medidas, é curioso notar que 50% da receita em emolumentos gerais aduaneiros referente à importação de produtos alimentares, segundo dados do BNA, representou 28 mil milhões Kz em 2022. Estimamos que em 2023 ande na ordem dos 35 mil milhões Kz. Em síntese, o que a medida representa, é que serão dedicados à aquisição da produção nacional anualmente cerca de 15 a 17 mil milhões Kz (assumindo que se mantenham as importações). Este valor é inferior ao valor despendido pela REA para aquisição da produção nacional, designadamente do milho em 2022.
Portanto, para além de não ser novidade, representa, infelizmente, uma redução de incentivos à produção ou à aquisição da produção nacional, salvo se existirem outras fontes de financiamento, entretanto não referidas pelo MECE, José de Lima Massano. A manutenção de um stock de fertilizantes e sementes também já se encontra em vigor, segundo dados divulgados publicamente pelo Ministério da Indústria e Comércio.
Não se consegue vislumbrar, salvo opinião mais bem fundamentada, como a REA conseguirá ser um instrumento de preços mínimos e nem de que preço estaremos a falar, com um plafond de 15 a17 mil milhões Kz.
Tal como o dissemos, nem tudo do passado está mal feito, comecemos por falar na protecção dos bens essenciais de amplo consumo, o Decreto Presidencial n.º 23/19, de 14 de Janeiro, designadamente nos seus artigos 11.º (que é um verdadeiro sistema de quotas) e 13.º é bastante compreensivo. Bastava ao MECE dizer que finalmente o Executivo iria aplicar, rigorosamente, este decreto. Está lá tudo, inclusive o direito de preferência do produtor nacional previsto no artigo 5.º deste diploma para vendas ao sector público, simples e eficaz. Logo, não se trata de uma nova medida, Senhor Ministro de Estado.
Esperamos, todos, que desta vez o discurso seja mesmo cumprido, sem os artifícios de sempre (de que a indústria nacional não tem capacidade, etc. etc.), designadamente das principais entidades públicas compradoras: Saúde, Educação, Construção, Energia, Ministério do Interior, Ministério da Defesa e afins.
Logo, em relação ao aumento da produção nacional, esperava-se uma maior audácia. É preciso fazer muito mais para resolver os problemas do País.
Apoio no acesso ao financiamento para o sector empresarial
Foram apresentadas 5 (cinco) medidas, apenas o cosseguro, que não se sabe se obrigatório ou não, representa uma verdadeira (não diríamos inovação) medida de impulsionamento à produção agrícola. Mas é apenas uma parte do puzzle. Importante, mas muito pequena.
Em relação aos demais aspectos, a primeira observação prende-se com a implementação da Lei das Garantias Mobiliárias.
Em relação aos demais aspectos, não existe nada que não esteja a ser feito actualmente, apenas com uma certeza: O Banco de Desenvolvimento de Angola (BDA) sozinho não conseguirá dinamizar uma economia de 35 milhões de habitantes, nem tão pouco a banca local com uma LUIBOR a 3 meses actualmente na casa dos 21,31%, quem pensa diferente, desconhece realmente as bases da economia ou é um milagreiro.
É fundamental resolver os problemas de financiamento à economia. E relativamente a este aspecto, nada foi dito. É mesmo preciso ser-se mais audaz!
Simplificação e alívio tributário
Os assessores do Senhor MECE, esqueceram-se, inclusive, de o lembrar que o IVA dos alimentos já é de 7% (noutros casos vai até mesmo aos 5%) a que se refere o n.º 4 do Artigo 15.º (“Sobre as Medidas de Cariz Fiscal e Aduaneiro para suporte do OGE 2023), da Lei n.º 2/23, de 13 de Março (Lei que aprova o OGE de 2023). Portanto, não há qualquer redução, Senhor Ministro de Estado para a Coordenação Económica. Puro “bungle bang” e todos angolanos sabem o significado.
Em relação ao pagamento diferido em 12 prestações do IVA na importação dos equipamentos para o sector industrial e agrícola, Senhor Ministro de Estado, é importante que se dê nota que este mecanismo, pelo menos em relação aos grandes importadores, já existe. Mas não é no diferimento que reside o problema. Porque não eliminar o IVA na importação de equipamentos industriais? É um custo adicional absurdo para os empreendedores. A título de exemplo: importar 10 milhões de dólares em equipamentos tem de obter financiamento que necessariamente tem de incluir mais 1,4 milhões USD para pagar IVA, aumentando o esforço e o custo na obtenção dos financiamentos.
Entendemos que, no capítulo da simplificação e alívio tributário, teria sido melhor nem se quer as mesmas terem sido apresentadas como medidas, mas a vontade de “aparecer” é sempre maior.
Por outro lado, não se percebe o que se pretende com a isenção do Imposto Predial (IP) nas transmissões de imóveis. Esta medida, de tributar por via do IPas transmissões onerosas de imóveis é, de per si, uma medida errada e deveria ser revogada. Por outro lado, sabe-se que o problema da dinamização do sector imobiliário não reside no IP, é uma pura ilusão. O problema do sector imobiliário são essencialmente dois: a) falta de financiamento a um custo aceitável; b) empobrecimento e fraco poder de aquisição dos angolanos.
Angola não pode inventar a roda. É só olharmos para o que está a acontecer na China.
Melhoria do ambiente de negócios
Neste capítulo, apesar de as medidas serem pouco detalhadas, poderemos até entender como positivas, dependendo do ângulo em que nos encontramos. Se estivermos a falar da atracção do Investimento Directo Estrangeiro em Angola (IDE), temos todos consciência que enquanto não resolvermos as questões essenciais da atractividade do IDE, não haverá IDE fora do sector petrolífero e mineiro em Angola.
Quais são as questões essenciais? i) mercado; ii) procura de recursos; III) procura de eficiência e; iv) procura de recursos estratégicos. Não temos os três primeiros e, por essa razão, o IDE tem-se concentrado na procura de recursos estratégicos (petrolíferos e mineiros).
Depois de vários anos, com a aprovação e alteração de várias leis do investimento privado, já deveríamos ter consciência que a solução virá de dentro e não de fora.
Em relação ao Balcão Único do Exportador, apesar de boa medida, de forma isolada, acrescentará muito pouco. É preciso rever todo o quadro normativo (eliminando barreiras) e que até poderão permitir que o País se torne num hub, explorando a sua localização geográfica estratégica para impulsionar o trading com os países vizinhos.
Na verdade, é preciso que os agentes económicos decidam onde colocar os seus produtos, se interna ou externamente em função do que eles entendem ser melhor para as suas actividades.
Até já… lembrando que falta muita audácia
C/ Telegrama