Notícias de Angola – Vice-presidente da República Bornito de Sousa pode demitir-se
O vice-presidente da República de Angola pondera seriamente apresentar nos próximos dias o seu pedido de demissão do cargo que ocupa desde Setembro de 2017, soube o CA de fonte geralmente bem informada.
A razão efectiva pela qual Bornito de Sousa deverá bater com a porta é o ostracismo a que se sente votado, embora oficialmente a carta possa evocar razões de saúde.
Em círculos privados, Bornito de Sousa tem-se manifestado descontente com as tarefas que (não) lhe são delegadas pelo titular do poder executivo que são, no seu entendimento, praticamente iguais a zero. O “adjunto” de João Lourenço julga que devia ter um papel mais interventivo.
Nas redes sociais, o vice-presidente tornou-se alvo de chacota diária em virtude do seu “sedentarismo”.
Bornito de Sousa tem compensado a falta de uma agenda oficial digna desse nome com uma frenética actividade nas redes socais. Ele é presença assídua em redes como o Twiter. À falta do que fazer, no dia 6 de Maio o vice-presidente da República de Angola regozijou-se com o nascimento do filho do “Duque (Harry) e da Duquesa (Meghan) de Sussex”. Bornito de Sousa foi ao detalhe: a criança nasceu com 3, 3 kg. O twiter, escrito em inglês e português, termina com Bornito de Sousa a felicitar o casal. Não se sabe se o vice-presidente fez essa diligência “diplomática” em nome pessoal ou se foi uma daquelas ninharias que o Presidente da República lhe delega.
O vice-presidente da República só não apresentou ainda o pedido porque está a aconselhar-se com alguns “históricos” do MPLA, depois de tê-lo feito já com a família, que lhe prometeu todo o apoio em caso de avançar com a sua pretensão. Bornito de Sousa está igualmente a avaliar os “estragos” da sua possível demissão no interior do MPLA, partido que sustenta o governo.
“Ele sente-se desaproveitado, sente-se pouco mais que uma figura decorativa. Pensa que podia ter uma intervenção maior e mais contínua, o que não tem acontecido. Por isso, pode apresentar proximamente o seu pedido de demissão, querendo fazê-lo sem provocar uma crise política no partido que, para ele, está acima de tudo e de todos”, disse a fonte ao Correio Angolense, antes de acrescentar que “a três anos das próximas eleições, este é o timing ideal para o fazer”.
De acordo com a Constituição da República de Angola, o vice-presidente é “um órgão auxiliar do PR no exercício da função executiva” (Artigo 131.º, 1), além de ser a entidade que “substitui o PR nas suas ausências no exterior do País, quando impossibilitado de exercer as suas funções, e nas situações de impedimento temporário, cabendo-lhe neste caso assumir a gestão corrente da função executiva”. Ademais, o Artigo 120.º, referente à Competência do PR como titular do Poder Executivo confere-lhe competência para “dirigir e orientar a acção do Vice-Presidente, dos Ministros de Estado e Ministros e dos Governadores de Província”.
Se Bornito de Sousa bater com porta, proceder-se-á como estabelece o n.º 2 do Artigo 132.º da CRA. “Verificando-se (…) vacatura do cargo de Vice-Presidente, o Presidente da República designa uma entidade eleita para o Parlamento pela lista do partido político ou coligação de partidos políticos mais votado, para exercer as funções de Vice-Presidente, ouvido o partido político ou a coligação de partidos políticos que apresentou a candidatura do Presidente da República, nos termos dos artigos 109.º e 143.º e seguintes da presente Constituição.”
A dissonância entre Bornito de Sousa e João Lourenço vem de trás. O primeiro e mais significado sinal dessa dissonância foi dado pelo próprio Bornito na célebre mensagem de cumprimentos de fim de ano, no dia 29 de dezembro de 2017.Nessa mensagem, Bornito deixou não foi capaz de disfarçar o lado para o qual pende: o do eduardismo. Num momento em que o Presidente da República ainda tateava nas novas funções, depois de colocar no topo das suas prioridades o combate à corrupção e à impunidade, já o vice-presidente enxergava fracturas no MPLA, revelando que alguns sectores do partido tomavam o caminho escolhido por João Lourenço como “acelerado demais” ao passo que outros diziam-no “distante demais das directivas” do partido. Segundo Bornito de Sousa, haveria ainda um terceiro sector do MPLA que colocava a opção escolhida por João Lourenço “na fronteira da quebra da unidade, motivo de mal-entendidos e naturais desconfortos”.
Na mesma mensagem, Bornito de Sousa sugeria que toda a acção do novo Presidente da República devia estribar-se exclusivamente na “Estratégia do Líder e no Programa do Governo do MPLA.”. O líder a que Bornito de Sousa se referia era José Eduardo dos Santos, nesse altura um homem já contestado no interior do seu próprio partido e nas ruas.
Nessa mensagem de Bornito de Sousa soou à apelo à bicefalia a afirmação de que “termino com uma breve nota sobre a coexistência entre a liderança do Partido e a titularidade do Executivo. A mesma é permitida tanto pela Constituição da República como pelos Estatutos do Partido no poder, sendo, portanto, apenas uma questão de gestão e oportunidade políticas”.
Observadores políticos consultados pelo Correio Angolense sugerem que o Presidente João Lourenço tomaria com alívio a eventual resignação do seu vice. “Afinal, eles não estão fadados a caminhar lado a lado. O Bornito continua agarrado à velha ordem, aquela que destruiu o país. O Bornito é um dos mais fortes símbolos do eduardismo”.
Salvo um episódio que envolveu, em 2015, a compra, pela filha, Naulila Diogo, de um vestido de noiva de 200.000.00 dólares, em Nova Iorque, Bornito de Sousa não é geralmente associado à ostentação e ao boçalismo, traços distintivos da generalidade dos corruptos angolanos. A sua resistência à cruzada contra a corrupção, impunidade e bajulação capitaneada por João Lourenço tem mais a ver com a sua fidelidade e lealdade caninas a José Eduardo dos Santos.
Fonte: CA