Notícias de Angola – Generais Kopelipa e Dino prometem devolver as suas fortunas
Dois dos mais poderosos homens do regime de José Eduardo dos Santos os generais Hélder Vieira Dias ‘Kopelipa’ e Leopoldino Nascimento ‘Dino’, constituídos arguidos na semana passada, renderam-se à pressão judicial de João Lourenço e sinalizaram a sua disponibilidade para entregar suas furtunas num universo de ativos que poderá estar avaliado em mais de mil milhões de dólares.
Manuel Vicente, atual vice-presidente de Angola e antigo patrão da Sonangol, é igualmente um dos principais acionistas do conglomerado empresarial que poderá passar temporariamente para a alçada do Estado.
Esta intenção está expressa num manifesto subscrito pelo antigo chefe da Casa Militar da Presidência angolana, general Kopelipa, entregue quinta-feira ao Presidente, João Lourenço.
O general Dino, ex-consultor para as comunicações de Eduardo dos Santos, acusado de crime de falsificação e burla, deverá liderar o processo de cedência de 40% do seu grupo na Biocom — empreendimento agroindustrial de produção e de transformação da cana em açúcar, etanol e energia, erguido com uma garantia soberana do Estado de 200 milhões de dólares e detido igualmente pela Sonangol, 20%, e a Odebrecht, 40%.
A Kero, a maior cadeia de supermercados de Angola, detida pelo trio, deverá igualmente ser entregue às autoridades. Corroborando a mesma intenção, mas suspeito de crime de corrupção e de branqueamento de capitais, o general Kopelipa, depois de já ter entregue a barragem das Mabubas e a Média Nova, disponibilizou-se a viabilizar agora também a entrega da Dumer — a maior gráfica do país.
“Comprovado o recurso a fundos públicos, a devolução do indevido, caso se prove que houve crime, pode funcionar como uma reparação do dano, com efeitos significativos na procedência, diminuição ou extinção da responsabilidade criminal”, disse ao Expresso o penalista Benja Satula.
A entrega daqueles bens surge depois de os dois generais terem sido envolvidos num alegado escândalo de corrupção envolvendo o ICBC — Banco Industrial e Comercial da China e o empresário sino-britânico Sam Pa. De duvidosa reputação, este empresário é acusado de alegada apropriação, através do CIF — China Internacional Fund, de créditos no valor de 2,5 mil milhões de dólares atribuídos em 2010 por Pequim ao Governo angolano.
Detido em 2015 por traição ao Partido Comunista Chinês, em 2017 Sam Pa envia uma procuração para Angola onde delega poderes ao general Dino para proceder à reestruturação do CIF local.
O sinal de alarme soa depois de a IF — sociedade angolana de investimentos financeiros —, subscrita por Samora Albino e pelo jurista Fernando Santos, mas controlada pelo general Dino, se ter apresentado como detentora de 60% do CIF Angola.
Tudo ter-se-á precipitado no início do ano letivo de 2019, quando o Governo Provincial de Luanda (GPL), ao habilitar-se à utilização de um complexo escolar e ao fazer a avaliação jurídica de 22 edifícios de 20 andares situados no Zango, alegadamente pertencentes aos chineses, foi confrontado com a resistência dos representantes angolanos do CIF, que reivindicavam para si a sua titularidade.
“Com fundos de proveniência duvidosa, consideramos, desde logo, insultuosa a tentativa de venda daqueles equipamentos por 25 milhões de dólares, proposta pelos angolanos em nome do CIF”, revelou ao Expresso o então vice-governador de Luanda, Júlio Bessa.
A inexistência do direito de superfície para a construção da obra fez destapar a primeira grande irregularidade no processo de surgimento em Angola do império de Sam Pa.
“Viemos a constatar logo a seguir que, afinal, o CIF nunca fez prova de entrada de fundos nem a importação de materiais de construção tinha prova do pagamento dos impostos alfandegários”, revelou fonte do Ministério das Finanças. Diligências feitas na China e em Singapura a mando de José Eduardo dos Santos pelo jurista Fernando Santos já haviam revelado o caráter obscuro e fraudulento da presença do CIF em Angola.
Sem nenhuma documentação, para as autoridades angolanas ficou claro que nenhuma entidade privada poderia justificar direitos de propriedade para proceder à entrega desses ativos ao Estado. Apesar disso, Manuel Vicente, a meio da operação, em 2019, convidou o general Kopelipa para passar a ser procurador legal do CIF, depois de já em 2011 terem sido outorgados poderes para o general Dino comprar 100% das ações da IF em caso de venda da participação de 60% desta sociedade no CIF.
Sem qualquer ligação acionista com os chineses ou com os angolanos da IF, e contrariando as pretensões da parte chinesa, Kopelipa decidiu agora colocar também à disposição das autoridades o vasto universo empresarial do CIF, que inclui uma fábrica de cerveja, uma cimenteira, uma central térmica e uma linha de montagem de autocarros.
“A chave deste negócio está agora nas mãos de Manuel Vicente, que, como antigo presidente da Sonangol, ao ter trazido o negócio para Angola, tem de abrir o jogo”, disse ao Expresso fonte judicial angolana.
O Expresso tentou obter um comentário junto dos visados mas, até ao fecho desta edição, não obteve qualquer resposta.
*Gustavo Costa
Fonte: Expresso